segunda-feira, 15 de agosto de 2011

MINHAS MEMÓRIAS - CAP. 4 (5)

CAPÍTULO 4
IDEIAS, INICIATIVAS E INVENÇÕES (5)

 “NAQUELA PRAÇA, NAQUELA RUA...” – RAUL SEIXAS 50 ANOS

Numa época não muito remota, quando ainda havia bancos nas praças (canteiros) da rua João Barbosa da Silva, Centro de Queimadas, e a população não precisava sentar-se nos degraus alheios, portas e calçadas para poder conversar, nessa mesma época eu costumava utilizar estas “pracinhas”, nosso único patrimônio público, para diversas brincadeiras.
Fosse para expor o boneco de Judas feito por mim, na Sexta-feira da Paixão, ou brincar sob a sombra das antigas amendoeiras (que eu adorava subir e comer seus frutos), o centro da rua era o meu grande palco. O lugar onde eu, entre outras coisas, costumava colocar uma caixa de som emprestada do amigo “Preá” de Tião e arrebentava na música do Raul, ouvindo meus antigos cassetes, hoje esquecidos numa estante.
Havia ainda os divertidos joguinhos de dominó, de onde toda noite saía uma confusão por causa de certas “gaboadas” tramadas. Os principais jogadores eram Moisés, Reinaldo, Du, Beto, Márcio Gordinho, Pepa (in memorian), Cristiano e Cristofher. Como não sabia jogar direito, eu participava apenas assentando pedras, e sendo o alvo das piadas dos demais. Porém, hoje em dia, já consigo dominar melhor uma partida, sem maiores decepções.

De pé: Reinaldo, Márcio (de preto), Bega, "Foguinho", Du e Moisés. Sentados: Gledson (de boné azul), "Bolar", Jeová, Beto e Pepa (in memorian).

 Na verdade, sempre tive algumas frustrações do tipo: não entender nada de uma partida de xadrez, o jogo dos intelectuais, ou simplesmente de baralho, talvez até por eu não haver desenvolvido uma base sólida de Matemática ainda na adolescência (não entendo nada de regras, fórmulas e coisas do gênero). Tampouco me preocupei em acompanhar, ao longo do tempo, os processos e inovações da tecnologia, especialmente na área da informática (sou um excluído digital). Eu sequer fiz um daqueles cursos de datilografia, no passado. Não tenho também um domínio básico de Inglês, o que me faz uma falta enorme. Não sei tocar violão, desenhar, andar a cavalo... não sei sequer algo tão simples como, por exemplo, nadar.
Enfim, são coisas diversas, as quais requerem apenas um mínimo de esforço mental ou, ainda, um mero aprendizado mecânico, nada mais que isso. Entretanto, são as mesmas que me perseguem e me frustram a cada vez que as recordo (ou que delas preciso). Eu sei que ninguém nessa vida sabe de tudo, mas, em todo caso, isso não me conforta nem um pouco.
Mudando de pau pra cacete, como diria um amigo meu, no dia 28 de junho de 1995, se estivesse vivo, o roqueiro Raul Seixas teria completado 50 anos de idade. E, “Só pra variar”, não deixei essa data passar em branco. 

Adesivo que fiz em comemoração aos 50 anos de idade (póstumos) de Raul Seixas

Como sabemos, essa é a época do ano, o tão esperado período junino, mês tradicional de soltar fogos. Portanto, aproveitei para comprar 50 bombas caseiras do tipo “canoa”, uma para cada ano de vida do Raul, e fiz uma grande girândola em volta do canteiro inicial da rua João Barbosa que, a essa altura, era mais largo. Para obtenção de um resultado positivo, antes de brincar com fogos, eu tomava algumas providências básicas.
Tudo que eu planejava, até então, costumava dar certo (o mesmo já não costumo dizer hoje em dia), pois eu sempre atentava aos menores detalhes. E para realizar essa “festinha” do barulho, primeiro comprei uma pólvora especial para fazer o rastilho (a mesma do explosivo), depois me certifiquei, mais ou menos, de que não ia chover naquela noite, consultando o “homem do tempo”, meu pai. Mas, principalmente, comprei bombinhas de ótima qualidade, fabricação nova e com um estopim seguro (eu chegava a acender uma na boca e atravessava a rua com ela, antes de explodir). Contei também com a ajuda de um voluntário, alguém que se dispôs a distribuir comigo as bombas nos seus devidos lugares.
Foi um sucesso, não falhou uma bombinha sequer! Ainda escrevi com a pólvora o nome RAUL, que queimou de maneira bem uniforme.

QUESTIONÁRIOS ESPECÍFICOS
Modéstia à parte, estes eram, sem dúvida, os cadernos mais inteligentes e mais bem estruturados quanto ao seu conteúdo, sem fugir à risca do seu contexto avaliador. Não havia uma garota em Queimadas que não tivesse a curiosidade de dar, pelo menos, uma olhadinha no teor das perguntas, que giravam quase sempre em torno de um só tema: o sexo.
Sem vulgaridades ou maiores complicações, eu procurava avaliar as dúvidas mais comuns e os fatos mais frequentes do dia a dia dos(as) jovens queimadenses, espelhando-se algumas vezes (sem muito êxito) nas minhas poucas experiências vividas sobre o assunto até então. E, se nessa época eu conseguia passar a impressão de um cara experiente e vivido, sexualmente falando, tudo não passava de um jogo de cintura do qual eu me utilizava para impressionar as garotas e assim, tentar fugir do meu próprio fracasso, de minhas frustrações. Especificamente, estes cadernos datam de 1994/ 96.
Havia os questionários exclusivamente femininos, os mistos e, pelo menos, um masculino, que eram considerados os cadernos mais “cultos”. Mas tinha também um em especial, no qual eu colocava os garotos contra as garotas e vice-versa (os/as 50 mais e menos), os quais se digladiavam através das perguntas e respostas, gerando assim muitas farpas e obscenidades, algo que eu não recomendava para todos.
Até hoje ainda possuo arquivados alguns exemplares destes “resquícios literários”, provas incontestáveis de uma geração que “botava mesmo pra quebrar”.

EXPOSIÇÕES/FOTOS DE ARTISTAS NO QUADRO DE LUZ
Como já dissera antes e repito por toda esta obra, o mercadinho do meu pai era a minha principal referência, o meu “quartel general”, o ponto de partida para qualquer aventura e onde eu naturalmente trabalhava, organizava e tinha sempre algumas ideias para diferenciar o ambiente.
A propósito, eu distribuía pôsteres de Raul Seixas pelas paredes, no interior da loja (eu não afugentava clientes com isso), e ainda escrevia frases de suas músicas por toda parte, explorando todos os espaços possíveis, ao som de um “maluco beleza” tocado lá no fundo. Caprichava também na decoração de Natal, enfeitando todos os anos o espaço da bomboniere com alguns detalhes natalinos e, por fim, utilizava com arte a tampa do quadro de luz para montar o que eu chamava de “exposições”.
Essas exposições, em forma de mosaico, nada mais eram do que colagens feitas com fotografias de artistas, retiradas de revistas, apenas para atrair a atenção de quem entrava na loja. Na verdade, eu esperava mesmo era pela “visita” das alunas do antigo Colégio Dulce Barbosa que, na época, adoravam ver fotos da Xuxa, Angélica e de várias outras estrelas, nacionais ou internacionais, até porque eu só expunha fotos de mulheres.
E como tudo um dia chega ao fim, essas exposições duraram até a 18ª, até o fatídico dia em que o mercadinho fechou para nunca mais abrir.

MALABARISMO COM FOGO E OS CIRCOS “MAMBEMBES”
O meu lado circense por vezes falava mais alto e eu não me contentava enquanto não aprendia certos truques. Mas não me refiro a estratagemas mágicos, e sim malabarismo (ver acróstico que fiz sobre malabarismo), a arte milenar praticada em circos do mundo todo e que eu tanto admiro, especialmente quando apresentada por um bom profissional.
Como malabarista amador, acredito que eu dava pro gasto (agora não mais, talvez), pois conseguia, entre outras coisas, dominar três malabares em chamas, passando as clavas por entre as pernas e ainda “cuspindo” fogo. Além do básico com as três bolinhas e também com as argolas, eu ainda dominava - como domino até hoje - uma bola de futebol (no campo sou um perfeito desastre), fazendo embaixadas com certo atrevimento ou simplesmente, colocando-a na ponta de uma caneta, em um rodopio contínuo. E a influência disto vinha justamente da minha admiração pela cultura circense, do meu lado atento como expectador e “agitador”.
Desde pequeno eu já frequentava os circos “mambembes”, aqueles bem pobrezinhos, e que vez ou outra aparecem nas pequenas cidades. O palhaço desse tipo de circo, sem qualquer constrangimento, já tem uma piada naturalmente pronta para essa ocasião. Ele costuma oferecer um automóvel 0 km para quem conseguir contar os buracos da lona...
Na minha adolescência (entre 1988 e 1995), eu costumava perturbar muito durante as apresentações nesses circos “baixa-renda”, fosse gritando, xingando, soltando arrotos, pulando nas arquibancadas (poleiros), e nunca estava sozinho, de modo que os organizadores, geralmente apresentadores e palhaços, tinham de parar o espetáculo várias vezes e nos chamar atenção.
Inevitavelmente, isso me faz lembrar agora as loucuras praticadas por Josembergue, o “Bega”, que nessa época, juntamente com César, Vital e “Calho”, montou um cirquinho nos fundos do antigo “Casarão”, o qual fica situado à rua João Barbosa, Centro. E a maior atração da noite era justamente Bega, o homem que comia vidro. Uma verdadeira loucura.

ARTESANATOS COM PALITOS DE PICOLÉ
Uma habilidade que conservo até os dias de hoje e que nunca deixei de manipular é a arte de unir e colar palitos de picolé, transformando-os em objetos decorativos como abajus, bandejas, caixas, casinhas, etc.
Aliás, eu sempre me amarrei em qualquer forma de artesanato (brinquedos de madeira, em barro, “mamulengos”...), especialmente em objetos confeccionados com material reciclável, como garrafas PET. E até mesmo em origami, a arte japonesa de transformar papel em brinquedos e esculturas, numa eterna tentativa de modificar as coisas a partir de materiais simples, iniciando quase sempre um novo desafio. Também adoro criar formas com o Tangran, as sete peças do mistério chinês.
Mas o meu forte já naquele tempo (de 1990 em diante) era a confecção de abajus, que sempre me rendiam algum dinheirinho extra, apesar do enorme trabalho que davam. Para isso eu contava com a ajuda de “voluntários”, garotos que saíam pelas ruas catando a “matéria-prima”, os palitos de que eu precisava, a troco de algumas bananas, laranjas e maçãs. Não era nenhuma exploração de menores, pelo contrário. Na verdade, eu proporcionava diversão para essa molecada, e ainda com direito a lanche.
Eu jamais comprava esse material, diferentemente de hoje. Apenas reciclava os palitos, lavando-os com água e sabão. Inclusive, nessa época, cheguei a construir, em vinte dias, um abajur especial com cerca de 1.500 palitos, vendendo-o por um ótimo preço ao amigo Ednaldo da Farmácia.
Continua...