Hoje, dia 18 de dezembro
de 2014, faz exatamente quatro anos que iniciei este Blog, um trabalho que eu esperava render por um ano ou talvez, um pouco mais. No entanto,
não parei mais de produzir material para as publicações aqui realizadas, sejam cordéis,
poesias diversas, textos literários, artigos e aproveitando também muita coisa da época ainda recente da faculdade.
Apresento nesta postagem
especial o cordel que escrevi sobre a vida de João de Carminho, uma pequena
biografia sobre um dos homens mais valentes que a cidade de Queimadas já
conheceu. É um material apenas superficial, não se aprofundando muito na vida
de João, este que é um dos personagens que vive até os dias de hoje no imaginário do povo queimadense, mesmo após os 38 anos de sua morte.
Enfim, eis o cordel mais
lido dessas últimas semanas em Queimadas.
QUEIMADAS, OUTUBRO/2014
Desde criança que ouço
falar
Das histórias de um
valente,
Um homem cuja trajetória
Tá na memória de muita
gente.
Peço licença e abro
caminho
Para lembrar João de Carminho,
Um grande mito queimadense.
Para lembrar João de Carminho,
Um grande mito queimadense.
Quem passou da meia idade
Alguma
vez já ouviu comentar
Sobre
essa figura destemida,
Que
virou lenda pelo lugar.
Um
homem fora do comum.
Como
ele não havia nenhum
Na
maneira de se comportar.
João Batista Barbosa
nasceu
Nos arredores de
Queimadas,
Em um sítio, Riacho do
Meio,
Onde sua história foi
traçada.
A data, 22 de
novembro/1922.
Alguém que se tornaria
depois
Uma personagem
imortalizada.
Filho de Manoel do Carmo,
Conhecido por Seu Carminho,
E de Dona Sebastiana
Ermínia,
Que o criou com muito carinho,
João cresceu num belo
recanto,
Desfrutando da vida do
campo,
Sendo guiado no bom
caminho.
De origem nobre, teve berço,
Sua família tinha propriedades,
Muita terra e cabeças de gado,
Nunca passou por dificuldades.
E assim, crescera desde então,
Ele e mais outros dez irmãos
Vivendo naquela comunidade.
Durante toda a sua infância
Viveu na fazenda dos pais,
E já saindo da adolescência
Descobriu do que era capaz.
Forte igual um boi de
arado,
Seu porte físico avantajado
Intimidava quaisquer
rivais.
Mesmo jovem já era audaz,
Tinha uma energia ilimitada,
Fora um excelente cavaleiro,
Correndo até em vaquejadas.
Na escola não se saiu mal,
Estudando só o Fundamental,
Numa época ainda atrasada.
Praticante de exercícios
físicos,
Sendo estes um tanto
puxados,
Fora um popular
“marombeiro”
Malhando halteres bem
pesados.
A propósito, a casa onde
nasceu
Resiste ao tempo como um
museu,
Havendo um desses
conservado.
Foi justamente seu lado atlético,
Fisiculturista, em especial,
Que o levou para tão distante,
Ausentando-se de sua terra natal.
Viveu assim o jovem aventureiro
Uma temporada no Rio de Janeiro,
Agindo em busca de um ideal.
No antigo Estado da
Guanabara
Participou de jogos
desportivos,
Representando a Marinha
nacional,
Sendo, portanto, um militar
efetivo.
Teve contato com pessoas
influentes,
Fotografou ao lado de
Presidente,
Socialmente, foi bem participativo.
Entretanto, o que lhe atraía
Era a vida na zona rural.
Seu contato com a natureza
Se mostrava algo essencial.
Deslocava-se do sítio à cidade,
Às vezes, por necessidade
Ou por um motivo especial.
De uma personalidade forte,
Jamais mandava dar recados,
Resolvia as coisas pessoalmente,
Fosse sozinho ou desarmado.
Reza a lenda e eu não minto,
Ele enfrentava mais de cinco,
Bastava apenas ser contrariado.
Um
homem de mil proezas,
Era
realmente destemido,
Não
tinha medo de nada,
Enfrentava
qualquer perigo.
Respeitado
na localidade,
Em
nada lembrava um covarde,
Encarando
de frente o inimigo.
De fato, João de Carminho
Fora um homem bastante forte,
Pra derrotá-lo num confronto
Tinha que contar com a sorte.
Ao longo de toda a sua vida
Atraiu confusão e muita briga,
Por vezes, escapando da morte.
Não
é difícil tentar associá-lo
A
Sansão, ou mesmo ao Tarzan,
Ao
personagem Tranca Rua
Do
poeta regional Amazan.
Embora
tivesse um ponto fraco,
A
sua relação com o álcool,
Arrependimento
das manhãs.
Nos dias atuais alguém diria
Que João seria um ser “bipolar”,
Pois quando começava a beber
Parecia querer se transformar.
Envolvia-se em brigas e lutas,
O que manchava a sua conduta,
Buscando em seguida reparar.
As
suas bravuras heróicas
Ultrapassavam
as fronteiras,
De
Queimadas a Fagundes,
Campina
Grande e região inteira.
Nas
décadas de 1950 a
1960
Criou
pra si uma fama violenta,
Aqui
e acolá fazendo besteira.
Era considerado por alguns
Um “play boy”, um desordeiro,
Um causador de confusões
E possivelmente um pistoleiro.
Apesar de que a fama lhe convém,
João nunca assassinou ninguém,
E muito menos por dinheiro.
Possuía
domínio de armas
E
uma admirável pontaria,
Fosse
revólver ou espingarda,
No
gatilho ele se garantia.
Vivia,
por ocasião, ameaçado,
Quase
sempre andava armado,
Fosse
à noite ou à luz do dia.
Segundo a própria família,
Ele se invadia por demais
Em conflitos e desordens
Que só tiravam a sua paz.
Respondeu a alguns processos,
Uma das provas do insucesso
E do que a violência traz.
Além
de bravo e audacioso,
Não
medindo consequências,
Era
também muito corajoso
Fazendo
uso da prudência.
Um
homem de moral e respeito
Que
fazia as coisas do seu jeito,
Procurando
manter a decência.
De acordo com as pessoas
Que com ele conviveram,
E relembrando alguns “causos”
De outros que já morreram,
João foi um tipo extraordinário,
Seu mito vive no imaginário
Daqueles que o sucederam.
Tinha
consideração pelos amigos,
Do
humilde ao mais influente,
Para
ele não havia distinção,
Era
solidário e sempre presente.
Sabia
conservar suas amizades
Tanto
no campo como na cidade,
Sendo
cordial com muita gente.
Seus princípios, no entanto
Ficavam bastante ameaçados,
No que ele “enchia a cara”
E terminava embriagado.
Nessa hora a sua postura
Valia-se da arma na cintura
E de um povo amedrontado.
Nossa
alegre Festa de Reis,
Uma tradição na cidade,
Fora
palco de arruaças,
Não
vou omitir a verdade.
Seguindo
pistas de então,
Todas
apontam para João,
Mas
sem maior gravidade.
Quando ele decidia aprontar
O aviso bem depressa corria,
Muitos preferiam nem arriscar,
Gente que dos festejos desistia.
Um evento tão antigo e anual
Ainda é lembrado na época atual
Pelo que João de Carminho fazia.
Partindo
da fazenda a galope
Ele
cavalgava em disparada,
Saltava
igualmente um jóquei
Ao
avistar uma porteira fechada.
Chegando
à rua, dirigia-se à festa,
Cruzava
a cavalo no meio desta,
A
essa altura quase paralisada.
Geralmente passava reto,
Queria apenas provocar,
Mas, se via algum desafeto,
A coisa podia esquentar...
A polícia pouco presente,
Com seu raro contingente,
Mal fazia a lei vigorar.
Impressionante mesmo de ver
Quando
a peleja saía no braço,
Socos,
empurrões e pontapés
Causando
enorme estardalhaço.
Era
somente violência, por sorte,
Festa
de Reis já lembrava morte,
Uma
observação que aqui faço.
Mereceu destaque uma briga
Na qual ele se feriu um bocado,
Ao enfrentar um enorme grupo
Que também saiu machucado.
Duelou, fez o que deu na telha,
Perdeu até parte de sua orelha
Nesse furdunço generalizado.
João
tinha um temperamento
Imprevisível
até por natureza.
Demonstrava
um lado religioso,
Por
vezes, dado à delicadeza.
Nunca
levava desaforo pra casa,
Porém
num ponto se destacava,
Isso
ninguém nega, com certeza.
Seu respeito pelas mulheres
Era, por certo, reconhecido,
Sendo cordial e cavalheiro,
Mesmo estando aborrecido.
Mesmo estando aborrecido.
Algo que pode ser comprovado,
Costume de um tempo passado
Que não deve ser esquecido.
Se
possível, comprava até briga
Ao
defender a honra de alguém,
Sendo
taxado como um fora da lei
E,
pelo contrário, fazendo o bem.
Seu
senso de justiça era notório,
Embora
parecesse contraditório,
Ficando
da própria fama refém.
Nem tudo que se refere a João
Consegue ser bem explicado.
Quando sua família não lembra
Algum episódio lá do passado,
O tema pode gerar discordância,
Com argumentos sem confiança,
Tornando um relato equivocado.
E
são diversas as histórias
Que
surgiram a seu respeito,
Algumas
sem muito crédito,
Mentiras
pra qualquer efeito.
Gente
que gosta de inventar
Procurando
tudo aumentar,
A
fim de arrancar proveito.
Uma delas, um tanto absurda,
Que gira em torno de seu mito,
Mesmo ouvindo inúmeras vezes,
Até o dia de hoje não acredito.
Relata um João sagaz e violento
Invadindo festas de casamento,
Para azar do convidado aflito.
E
o que era até pior, pasmem!
Fazendo
papel de cangaceiro,
Onde
raptava a recém casada
Deixando
o marido em desespero.
Esse
e outros boatos parecidos
Sempre
foram a ele atribuídos,
Embora
não sendo verdadeiros.
Histórias que não procedem
São, no mínimo, incoerentes,
Uma vez que João de Carminho
Fora um homem digno e decente.
Sua reputação e caráter ilibados
Haviam logo de ser lembrados
Quando abusava da aguardente.
Contudo,
depois de certa idade,
Devido
sua condição de casado,
João
se afastou da vida boêmica,
Largando
alguns vícios de lado.
Ao
final da década de 1960
Toda
aquela sua fama violenta
Dera
lugar a um esposo dedicado.
Trabalhando com Seu Carminho
Ele passou a dirigir caminhão,
Viajava até o Rio de Janeiro
Dividindo com o pai a direção.
Fazia transporte “pau de arara”
Ao então Estado da Guanabara,
Não demorando nessa profissão.
Fez
diversas viagens e fretes,
Mas
sempre retornando ao lar.
Possuía
agora mulher e filhos,
Obrigações
que o fizeram mudar.
Vivia
da terra e criação de gado,
Confusões
eram coisas do passado,
Ainda
que viessem lhe atormentar.
Quem diria que aquele rapaz,
Nascido no sítio Riacho do Meio,
Tornar-se-ia uma lenda capaz
De despertar o medo e receio.
Mesmo agindo de forma natural,
Conseguia impor respeito e moral,
Mostrando assim pro que veio.
No
dia 20 de novembro de 1976,
Um
sábado como outro qualquer,
A
feira em Queimadas já no fim,
João
tranquilamente andava a pé.
Seguia
em paz, indo comprar pão,
Ao
dobrar o primeiro quarteirão
Teve
o destino que ninguém quer.
Surpreendido, tomou cinco tiros,
Sequer deu tempo dele reagir,
Saiu cambaleando pela calçada
Com todas as forças a resistir.
Havia caído em uma emboscada,
Em uma tocaia premeditada,
Onde buscaram antes o distrair.
Ainda
chegou a ser socorrido
Porém
de nada isso adiantou,
Teve
sua morte ali decretada
Pelo
policial que o alvejou.
E
após vinte anos sem solução
Houve
julgamento sem punição,
Um
crime covarde que expirou.
Logo em seguida à sua morte,
Novos “causos” foram surgindo,
Alimentando um mito e também,
Por tantas vezes, o denegrindo.
Seja como um herói ou bandido,
João jamais será esquecido,
No imaginário resistindo.
Que
a verdade possa ser dita
E
se espalhe por todo canto:
João
de Carminho em vida
Não
foi, assim, nenhum santo.
Todavia,
tinha suas qualidades.
Quem
o conheceu de verdade
Preza
a sua honra, eu garanto.
Fica aqui minha homenagem
A este homem que outrora,
Por seus feitos e bravuras,
Deixou seu nome na História.
Portanto, seja em verso ou prosa,
Falar de João Batista Barbosa
É contribuir com a memória.
Muito bom, meu irmão! Um cordel que já entrou pra história.
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