sábado, 22 de janeiro de 2011

MINHAS MEMÓRIAS - CAP. 2

CAPÍTULO 2
AS MIL E UMA BRINCADEIRAS DE UMA INFÂNCIA INESQUECÍVEL

Para determinadas brincadeiras locais havia sempre uma época específica, um tempo pra lá de delicioso que, simplesmente, chegava como uma moda passageira e conseguia arrastar a todos. Até hoje eu não sei dizer ao certo quem era ou o que dava início a esse processo natural de fases, o qual abrangia toda a cidade de Queimadas.
Por exemplo, de repente aparecia, surgia do nada o “tempo” de brincar com pião, e todo mundo tinha um pião na mão. Assim era com pipa (que nunca fui muito chegado, principalmente empinada com cerol), bolinha de gude, carrinho de lata...
E qualquer que fosse a brincadeira, em qualquer época, lá estava eu, sempre pronto para brincar e com o meu “equipamento” em dia, com a única preocupação de um moleque de 10 ou 12 anos: divertir-se e ser feliz. Só lamento não haver fotografias dessa fase em meus registros (a exceção é uma da minha irmã, Adriana), o que tornaria as páginas seguintes ainda mais interessantes.
 A seguir, algumas das brincadeiras/brinquedos que eu costumava brincar quando menino:

TAMPINHAS DE GARRAFA
Juntar tampinhas de garrafa (chapinhas de metal) era uma das minhas brincadeiras favoritas. Eu conseguia reunir verdadeiros depósitos, para desespero da minha mãe. Dava para fazer muita coisa com elas, como castelinhos, estradas para os meus carrinhos, alguns mosaicos, etc.
E isso me faz lembrar, agora, algo que eu presenciei em 1979: o casamento dos meus pais, no religioso e no civil, uma união oficial um pouco tardia. Durante a festa realizada em nossa antiga casa, antes mesmo de haver construído o novo prédio, eu, com meus 6 aninhos, só queria mesmo saber de catar as tampinhas no meio dos convidados.

NOTINHAS FEITAS DE MAÇOS DE CIGARRO
Como era gostoso brincar com carteiras vazias de cigarro, que “desmanchadas” valiam como dinheirinho. Cada notinha com seu determinado valor. Fazíamos laça-laças; brincávamos de banco, depositando os nossos “milhões”; ou simplesmente se jogava apostado no “patacho”, atirando-se um pedaço de tijolo ou cerâmica, em contrapartida ao lance adversário. Eu, inclusive, colecionava aquelas notinhas mais bonitas e raras, difíceis de serem encontradas.

BOLINHAS DE GUDE
Jogávamos as bolinhas apostadas, principalmente, num jogo que consistia em preencher três “bocas” escavadas no chão. Pedia-se, antes de tudo, um “boliboca” ou “licença-busca”, permissão para açoitar a bolinha do adversário, e com isso deixá-lo para trás. Havia nesse jogo o “trâin”, licença para poder realizar um ângulo melhor na jogada. Tinha também a condição do “féda”, do “mata”... para ser um “mata” o jogador tinha que, antes, “corrigir” todas as bocas, e só assim poder perseguir os demais.

CASTANHAS DE CAJU
Na safra do caju, final de ano, havia uma grande movimentação entre a molecada para ver quem juntava mais castanhas, no intuito de assá-las. E, portanto, brincávamos muito no “pitelo”, jogando apostado para ver quem derrubava uma castanha especial escolhida pelos jogadores e privilegiada pela natureza. Os mais corajosos arriscavam-se no “junta”, num recanto de parede, onde se perdia ou se ganhava tudo. Dava para voltar para casa, às vezes, com um saco bem cheio. Se bem que alguns preferiam roubar “maturis” na serra, aqueles cajuzinhos ainda em desenvolvimento.                                                                       

PNEU DE CARRO COM VARAS
Era o melhor brinquedo, na opinião de João da Cruz, até melhor que pipas. E só era necessário para isso um pneu velho de carro e dois cabos de vassoura, para guiar e frear o pneu, simultaneamente. Para uma melhor mobilidade, jogava-se um pouco de água ou óleo diesel dentro do pneu que, por sua vez, não podia ter buracos. Nenhum menino brinca mais disto.

PNEUZINHO IMPULSIONADO POR GANCHO
Uma engrenagem simples, que consistia apenas em uma pequena roda (de borracha ou metálica) e um ferro retorcido em forma de gancho. Mas que funcionava perfeitamente, permitindo realizar curvas e andar em campo reto por muito tempo, antes de cair. Dava também para fazer obstáculos e ainda andar na chuva, atravessando poças d’água.

CARRINHOS DE LATA
Os carrinhos mais bonitos e também mais enfeitados que eu mesmo produzia pra brincar (eu só perdia, no entanto, para meu amigo Joel, o Joel Cantor, um verdadeiro artesão na época de garoto). Eram caminhõezinhos ou carretinhas, com os quais realizávamos “viagens” em comboios que percorriam por toda a cidade, normalmente carregados com serragem de madeira ou “juá”. Diverti-me muito nessa época, brincando com amigos como Ironildo, Mininim e Hélio, meus contemporâneos de brincadeiras.

CARRINHOS DE MÃO, TIPO CARROCINHAS DE OBRA
“Fabricados” com caixas de maçãs, uns engradados especiais de madeira que vinham com frutas argentinas (mercadorias que vendíamos), estes carrinhos chamavam atenção por onde eu passava, quase sempre conduzindo algum moleque de carona. A roda eu retirava do meu antigo velocípede vermelho, que eu ganhara quando tinha sete anos de idade.
Minha irmã Adriana, aos 4 anos, desfilando com o meu velocípede vermelho.

Na minha “oficina” que ficava ao lado da cisterna, herança da nossa antiga casa, eu criava de tudo, e não pára por aqui.

O SUPERCARRO
Com certo conforto e dirigibilidade, esse foi um desafio que eu quase fundi a cuca para projetá-lo. Contudo, era um mecanismo bastante simples, feito a partir das rodas de um velotrol quebrado, com uma base toda em madeira e alguma ferragem (trabalho de Estefâneo).
Era pura diversão descer a calçada do colégio de D. Dulce, quase sempre à noite, e frear lá embaixo, dando um enorme cavalo de pau. Reinaldo, meu irmão, na época, pequenininho, adorava brincar com ele.
Ao final de 1986, quando meu pai decidira vender, por questões de dívidas, um armazém que ficava por trás de nossa casa (meu santuário de brincadeiras), eu não só perdi um espaço para brincar, como também fiquei sem ter onde guardar o supercarro. Portanto, presenteei-o ao amigo Flaudemir, que o levou para sua casa sem demora.

PERNAS DE PAU
Do alto de 1 metro e pouco de altura, em pernas de pau controladas com as mãos, eu arriscava-me andando pelas calçadas e ruas de Queimadas, e só tinha apenas 12 ou 13 anos nessa época. Para completar, uma “reca” enorme de meninos acompanhava-me e eu saía, então, dando uma de anunciante de circo:
- Ô pêlega, pêga-pêga...
Todos, por sua vez, gritavam:
- Eu peguei no pé da nega!!
- Benedito Bacurau...

Em algumas brincadeiras como esta, fui pioneiro.

ESTILINGUE
Ou melhor, “balieira”, as armas que fazíamos para “caçar”. Mas que fique bem claro uma coisa: eu nunca, em toda minha vida, matei um passarinho, só lagartixas (o que também não deixa de ser uma crueldade). E também nunca participei de certas “cirurgias” à base de bisturis e seringas usadas que alguns garotos faziam com esses animais. Desde criança eu já apresentava certa consciência ecológica, embora adorasse andar com um “bodoque” pendurado no pescoço.

PIÃO
Uma das brincadeiras mais divertidas de todos os tempos, das mais tradicionais, um verdadeiro brinquedo de menino. Brincávamos muito no “boi”, com o objetivo de arrancar outros piões de um círculo feito no chão.
Segundo as regras, antes de arremessá-lo contra os demais, ou melhor, de dar uma “turinada”, era necessário pedir “licença-pausa” para não correr o risco de perder o pião, se acaso ele batesse em alguém.

ESPETO
Quando chovia e a terra permanecia molhada por algum tempo, surgia, então, essa brincadeira curiosa. O espeto consistia em “conferir” com um pedaço de ferro bem fininho algumas casas riscadas no chão, geralmente na forma de um desenho. E, ao final, procurava-se espetar o “boi”, uma casca de laranja ou um pedaço de plástico fincado no chão. Só era necessário o cuidado para não furar o próprio pé no ato do arremesso.

ARCO E FLECHA DE ARMAÇÃO DE GUARDA-CHUVA
Um brinquedo um tanto perigoso e o qual eu montava a partir de um guarda-chuva velho ou quebrado (essa ideia, na verdade, eu a copiei de Sandro). Era muito divertido fazer alvos em pés de mamão ou bananeira, podendo contar ainda com uma mira bastante precisa, desde que impulsionado de perto. Uma invenção rústica, porém bastante divertida.
Em tempo recordo aqui a surra que o meu amigo Nathan Brunner levou de sua mãe por causa de certo guarda-chuva que ele quebrara, surra esta que ele nunca fez questão de esconder.

ÁLBUNS DE FIGURINHAS
Eu tinha coleções e mais coleções de figurinhas, além de seus respectivos álbuns. Fossem eles comprados em Seu Osemar e que ainda concorriam a prêmios, os autocolantes ilustrados de super-heróis, ou também aqueles adquiridos pelos correios, em promoções de chocolates, chicletes... inclusive, ainda guardo até hoje alguns exemplares, juntamente com outras tantas “relíquias” do gênero.

GIBIS
Durante um longo período, o qual perdurou por muito tempo, eu participei ativamente de muitas trocas e “rolos” envolvendo todo tipo de revista em quadrinho, principalmente as infantis. Por várias vezes cheguei a dobrar o meu montante de revistinhas, mas sempre com o princípio inalterável de nunca comprar uma sequer.
Era exatamente aí que estava o sentido da coisa, o prazer da multiplicação, mas fazendo somente aquilo que estava dentro do meu limite, do meu alcance. Ou seja, bom mesmo era encontrar, de vez em quando, um “trouxa” que não valorizava os seus gibis, trocando dois por um. Mais tarde, o meu próprio irmão seria um desses meus “fregueses”. 

BRINCADEIRAS EM RUA ABERTA
Do tipo pega-pega (toca), esconde-esconde, pique-alto, barra-bandeira, queimada (ou baliada), cabra-cega, pula-carniça ou “estrela nova sela”, garrafão (semelhante ao “taco” no Rio de Janeiro), “batebol” (uma “baliada” diferente, jogada com os pés e que eu adaptei, mesmo sem saber da existência do dodgeball, um jogo americano do qual tem tudo a ver), quebra-coco (durante a Semana Santa, uma espécie de jogo bem antigo e quase já esquecido), polícia e bandido, guerra de espadas, peladas e rachas, ou até mesmo, quando se juntavam vários meninos, um seleto grupinho liderado por “Helinho” e “Mininim”, para me pegar.
Esses indivíduos cercavam-me, vinham para cima de mim e eu, como sempre, só podia mesmo era correr para defender-me. E o pior é que eles tinham mesmo a intenção de machucar-me, inocentemente (?) munidos com pedaços de pau e até pedras. Quantas saudades daquele tempo!!!
...
Numa época em que esses jogos eletrônicos, tão populares hoje em dia, ainda eram considerados coisas de “rico”, havia uma tendência entre a garotada em improvisar os seus próprios brinquedos. E, diga-se de passagem: como éramos criativos!
Aqueles que nunca recebiam a visita do “Papai Noel”, mais do que outros, tinham a necessidade de inventar, de bolar qualquer coisa que pudesse servir como diversão. Talvez, quem sabe, um carrinho de rolimãs, algo sofisticado até demais para alguns. Dependendo da criatividade, o menino também podia manipular argila e criar seus próprios bonequinhos e “boizinhos” de barro, ou simplesmente ter um daqueles carrinhos feitos com uma garrafa de desinfetante (água sanitária) cheia de areia, sem esquecer-se, portanto, daquela “tira batedeira” barulhenta chicoteando as calçadas.
Havia ainda aqueles “carrinhos” feitos a partir de um carretel de linha, uma liga e um pedaço de vela, que produziam um movimento meio em câmera lenta. Ou então, aqueles brinquedinhos feitos a partir de uma tampinha de garrafa, amassada e com dois furinhos no centro, por onde se passa uma linha forte que, depois de algumas voltas, dá certa “tração”, lembrando até um motorzinho. Eu particularmente brincava com todas essas modalidades, improvisações e muitos mais.
Segundo o ditado, a necessidade é a mãe da invenção, e eu, por minha vez, não tinha muito do que reclamar. Ganhava com frequência alguns brinquedos, reconheço, mas isso, para mim, não era o suficiente. O meu negócio era criar, inventar, ter sempre em mente uma coisa diferente (e rimando constantemente). Essa é a origem, modestamente falando, de tanta criatividade.
Embora isso pudesse gerar uma certa “inveja” da parte de alguns, “intrigas” e coisas do gênero (relativos à infância), ainda assim a minha convivência com todos eles, amigos e parceiros de brincadeiras, como eu já dissera antes, era uma das melhores possíveis.
Continua...

Um comentário:

  1. Éh meu velho amigo, que saudades, nostalgia da porrraaa!!! Bons tempos esses que não voltam, mas que pra sempre estaram vivas em minha memória. Somos sortudos por sermos de uma época realmente mágica.

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