Para comemorar hoje, dia 18 de dezembro, os dois anos
do BLOG LITERÁRIO – E INTERDISCIPLINAR – PAULO SEIXAS, apresento aqui a
primeira sequência de poemas do meu debochado livrinho (projeto) – MEMÓRIAS IMEMORÁVEIS DA ÁGUA PURA. São relatos confidenciais
de um humilde entregador de água mineral (esse que vos fala) que “ralava” muito
no Rio de Janeiro durante essa época, mais precisamente, entre os anos de 2003 a 2007. E o "palco" dessa empreitada era o depósito de águas ÁGUA PURA, localizado no LEME, zona sul do Rio, que me serviu ainda como fonte de inspiração. Confiram e Boa
diversão!
MEMÓRIAS
IMEMORÁVEIS
DE CERTO FUNCIONÁRIO
(ENTREGADOR)
DA
ÁGUA PURA
A SUCURSAL DO INFERNO
Paulo A. Vieira
RIO DE
JANEIRO,
JULHO/2006.
Nascer pobre é pedir para sofrer
Sabendo
disto é que eu gostaria
De ser
pobre somente um dia
Porque
a vida toda é de doer.
Mas
que castigo eu fui merecer
Estou pagando
por algum pecado?!
Viver pra
sempre assim, humilhado
Com
esse destino que me conduz,
Será que
atirei pedras na cruz?!
Vai pro
inferno, azar desgraçado!
Paulo A. Vieira
À D. Márcia, Mazinho (apesar de tudo), Eric Riboredo e a toda “peãozada” que deu o sangue trabalhando na Água Pura. Acreditem: Eu era feliz e não sabia...
ÍNDICE
· NA “ÁGUA PURA” É ASSIM .... - Pág. 07
·
LAMENTO DE UM ENTREGADOR - Pág. 15
·
A VERDADE ABSOLUTA - Pág. 23
·
SAÍDA VETADA - Pág. 27
·
S.O.S. - Pág. 28
·
RETORNO INFELIZ - Pág. 29
·
NEGÓCIO FRUSTRADO - Pág. 33
·
O ÚLTIMO SUSPIRO - Pág. 35
·
O ENTREGADOR DE AÇO - Pág. 43
“O operário cada vez se empobrece mais quando produz mais riquezas.”
(Karl Marx)
NA “ÁGUA PURA” É ASSIM...
Há trabalho que se suporte
Outros
do tipo “ainda se atura”,
Há
trabalhos que levam à morte
Ou
que fazem beirar a loucura.
-
Desafie então a sua sorte
Trabalhando
na Água Pura!
Um serviço um tanto arriscado
De
tão pesado, até desespera,
Imagine
um triciclo quebrado
Descendo
a mil numa banguela;
Pode
deixar o sujeito acamado
O
crânio rachado e as costelas.
Uma fábrica de gerar doente
Seja
peladura ou arranhão,
Coluna
não há quem aguente
É
muito esforço e contusão.
E
ainda se pode ficar contente
Quando
não quebra garrafão.
Para cada garrafão quebrado
Eis
que surge uma cena ingrata;
No
salário já vem descontado
Pelo
empregador sangue de barata.
É o
entregador sendo maltratado
Tal
qual um cachorro vira-lata.
Nem Jesus Cristo no calvário
Sofreu
tamanha humilhação,
Em
sua época não havia otário
Que
trabalhasse por comissão;
O
justo deveria ser um salário
Mais
porcentagem em cada galão.
Pra compensar o trabalho extra
Que
há de sempre aparecer,
Desacompanhado
de gorjeta
Fazendo
o entregador sofrer;
Lavar
garrafão de madame besta
Sem ter
caixinha é de doer.
É a “caixinha” que fortalece
O
salário do trabalhador,
Tem
gente que até se esquece
Do
direito de um entregador,
Que
faz por onde e merece
Uma
moeda de qualquer valor.
Lembrando aqui uma raça
Existente
no Rio de Janeiro,
Certamente
a pior desgraça
E
que abrange o mundo inteiro.
Nenhum
entregador aguenta
Essa
racinha tão nojenta
Que
é a do “pirangueiro”.
Um miserável que faz conta
Da
moedinha de 1 centavo,
Merece
mesmo levar uma ponta
Não
passa de um corno safado.
Um
filha da puta, um “mindingo”,
Deixa
de ir à missa aos domingos
Para
não ter que dar um trocado.
Pode até parecer loucura
Gostar
de um lugar assim,
Ser
entregador na Água Pura
É
buscar o seu próprio fim,
Um
trabalho que é a mistura
Daquilo
que há de mais ruim.
Mas o Diabo que se condena
Não
é tão feio como se pinta,
Tem
dias que até vale a pena
Fazer
entregas, mas não se minta:
Tem
que haver feriado em cena
Ou
que o mês seja de trinta.
Um trabalho onde não há patrão
Talvez
por isso até seja bom,
Ruim
é descarregar caminhão
Ir
pra Botafogo ou Leblon,
E
ainda ter que limpar chão
Uma
invenção do Seu Ision.
Sem essa de lavar banheiro
Entregador
não é escravo,
Isso
é serviço de faxineiro
E
pra isso ninguém é pago;
Acrescentem
mais dinheiro
Ou a
faxina fica de lado.
É do Mazinho essa obrigação
Não
faz nada o dia inteiro,
Só
vive a soprar garrafão
Em
perturbação é o primeiro;
O
seu diploma de musculação
Procure
usar no banheiro.
O entregador que se preza
Vive
reclamando a toda hora,
Pede
acordo, chora e reza,
Implorando
pra ir embora.
Desenganado,
até Deus despreza,
Rogando
ao Diabo uma melhora.
Até porque ser despedido
Isso
é caso de muita luta,
Nem
que alguém tenha ofendido
Algum
cliente filha da puta.
No
entanto, vem logo o castigo,
Um
“Leblon” bem sacudido
Como
uma espécie de multa.
Não é à toa que um Fulano
Que
sequer vem trabalhar,
Consegue
ficar quatro anos
Empregado
neste lugar.
Aqui
se aceita todo mundo,
Safado,
vigarista, vagabundo,
Basta
apenas saber pedalar.
O sofrimento só é constante
Para
quem decide encarar,
Aquele
novato, o iniciante,
A
qualquer hora pode rodar.
Somente
a carteira assinada
É a
garantia confirmada
De
quem pretende bagunçar.
Tantos por aqui já passaram
Alguns
sequer completaram o dia,
Mas
em sua passagem deixaram
Um
rastro de sangue e agonia.
Hoje,
enfim, os que escaparam
Encontram-se
loucos ou se deparam
Em
alguma sala de psiquiatria.
Dos que começaram o ano
Resta
a metade da demanda,
O
velho Jorge do Turano
O Karlão da Nova Holanda,
E o Marcelo Manjubinha
Morador
lá da Rocinha
Que “faz
água” pra caramba.
Tem o “Berone” Marcha-Lenta
Trabalhando
clandestino,
Haroldo
Bucha, ninguém aguenta,
Só
sabe viver dormindo,
E o André, sujeito sem futuro,
Uma
briga de foice no escuro
É
mais bonita que ele rindo.
E o narrador deste fatos
Que
não se esconde na história,
Testemunha
de alguns atos
Que
hão de ficar na memória,
E
que jamais esquecerá a loucura
De
haver pisado na Água Pura
Uma
prisão sem escapatória.
No fim, a liberdade prevalece,
Apesar
de muito se lamentar,
Trabalhou
na Água Pura não esquece
Vez
ou outra se pensa em voltar.
É um
castigo que ninguém merece,
Mas
a gorjeta que fortalece
É um
incentivo para retornar.
Dê seu sangue por este lugar
Que
haverá de se arrepender,
Faça
o seu nome se destacar
Que
vão fazer você sofrer,
E se
ficar em 1º no placar
Não
vá depois se lamentar
Das
dores que irão lhe ocorrer.
RIO, JUNHO/2003
Continua...
Muito bom Paulo, Realmente a vida de um entregador de "Água Pura" não é fácil, fiquei surpreso com o fato do entregador fazer uma tarefa de faxineiro. eu acredito que isso não ocorre somente nessa profissão, é uma exploração muito grande! Quanto ao cordel gostei bastante e aguardo a continuação...
ResponderExcluiré cada história...
ResponderExcluirmas a história se repete.
se repete na história de cada indivíduo.
se repete na hisatória de indivíduos semelhantes, de seemelhates heranças.